Em
15 de Março de 1990 tomava posse na Presidência da República Federativa
do Brasil, o Alagoano Fernando de Collor de Mello, considerado uma
surpresa no processo eleitoral de 1989, ganhou a eleição com o slogan
que seria o caçador de marajás, isto é, que combateria aquelas
pessoas que eram funcionários públicos e que vivam com gigantescos
vencimentos, respirava-se uma esperança que o Brasil não seria o mesmo
depois dos cinco anos que Collor ocuparia o palácio do Planalto.
É
verdade que o Brasil não foi o mesmo 930 dias depois daquele 15 de
março de 1990, o Brasil sofreria aquilo que prefiro chamar de Genocídio
em forma de pacote econômico, e foi abalado por uma avalanche de
escândalos políticos que por pouco acabaram com o então recente processo
de redemocratização do Brasil.
Se
houve uma coisa boa que o Governo Collor trouxe ao Brasil, foi que,
pela primeira vez em sua história, houve um movimento que levou a
deposição de seu presidente pela via democrática, e também foi o
primeiro movimento contra a corrupção, pois movimentos com grandes
quantidades de pessoas já havia ocorrido em 1984 com as Diretas Já, cuja
repercussão reflete em nossos dias nos protestos contra a corrupção.
O
rápido interlúdio de Fernando Collor de Mello pela Presidência da
República é o tema de hoje da Série História do Brasil Contemporâneo.
A Eleição de 1989
A
Constituição de 1988 determinava a realização de eleições diretas para
presidente no ano seguinte. Durante o governo Sarney, partidos até então
clandestinos como o PSB, o PCB e o PCdoB foram legalizados.
Assim
sendo, as eleições de 1989 foram as primeiras desde 1960 em que os
cidadãos brasileiros aptos a votar escolheram seu presidente da
república. Por serem relativamente novos, os partidos políticos estavam
pouco mobilizados e vinte e duas candidaturas à presidência foram
lançadas. Essa quantidade expressiva de candidatos mantém o recorde de
eleição presidencial com mais candidatos. Foi também a primeira eleição
na qual uma mulher disputou o posto mais elevado da República – Lívia
Maria do Partido Nacionalista (PN).

Como
nenhum candidato obteve a maioria absoluta dos votos válidos, isto é,
excluídos os brancos e nulos, a eleição foi realizada em dois turnos,
conforme a então nova lei previa. O primeiro foi realizado em 15 de
novembro de 1989, data que marcava o centésimo aniversário da
proclamação da República, e o segundo em 17 de dezembro do mesmo ano.
Foram para o segundo turno os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva, da
coligação encabeçada pelo Partido dos Trabalhadores, e Fernando Collor
de Mello, da coligação encabeçada pelo hoje extinto Partido da
Reconstrução Nacional.

Fernando
Collor, um jovem governador de Alagoas, que ganhara a fama nacional de
caçador de marajás devido ao combate aos funcionários públicos que
ganhavam supersalarios, era visto como a única perspectiva para
determinados setores conservadores do Brasil para combater as forças de
esquerda que ganhavam força devido a forte oposição que o Governo Sarney
e seu falido modelo econômico estavam sofrendo entre 1988 e 1989, por
isso, grandes setores do patronato brasileiro, incluindo aí famosos
grandes conglomerados de comunicação, apoiaram substancialmente a
campanha de Fernando Collor de Mello, esse apoio era mais devido ao medo
de Lula do que simpatia a Collor, é só ver que depois que o movimento
do Impeachment ganhou força, esses setores foram os primeiros a
abandonar o apoio.

Como
foi dito, o segundo turno ficou polarizado entre Collor e Lula,
utilizando-se de uma campanha de recursos ilimitados, táticas baixas e
apelando ao medo da classe média do perigo vermelho representado por
Lula, Fernando Collor venceu o segundo turno da Eleição de 1989 a 17 de
Dezembro como 49,94% dos votos, contra 44,23% de Lula e 5,82% de votos
nulos e em branco.
O Confisco de 1990
Ao
tomar posse em 15 de Março de 1990, Collor se tornava o primeiro civil
eleito democraticamente a assumir a cadeira no Palácio do Planalto desde
Jânio Quadros três décadas antes, e logo ele colocou em ação seu plano
de estabilização econômica, segundo seus mentores tinham os seguintes
objetivos: “Empreender a modernização administrativa, Privatizar
empresas estatais, combater monopólios, e abrindo o país à concorrência
internacional e desburocratizar as regulamentações econômicas, etc.”.
No
dia seguinte, a equipe econômica de Collor baixou um pacote econômico
cujas medidas hoje são consideradas muito severas, mas que para os
assessores de Collor eram necessárias para combater a inflação que tinha
chegado a 2.751% no ultimo ano de Sarney no governo, era o Plano Brasil
Novo, conhecido popularmente como Plano Collor, que tinha como medidas:
1. Bloqueou
contas e aplicações financeiras nos bancos, isto é, dinheiro em conta
corrente, poupança, que não tinha ganhos altos, foram bloqueadas pelo
governo.
2. O confisco de 80% de todo o dinheiro em circulação no Brasil.
3. Extinguiu a moeda vigente, O Cruzado, e ressuscitou o Cruzeiro.
4. Extinção e Privatização de Empresas
Públicas (empresas com IBC, Embrafilme, foram extintas, acarretando
prejuízos aos setores que eram auxiliados pelas políticas desses órgãos)
e demissão de milhares de funcionários públicos.
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Anuncio das Medidas do Plano Brasil Novo em Março de 1990 |
Foi
imenso o impacto do Plano Collor, mas, apesar do choque, grande parte
da população aceitou o sacrifício imposto, principalmente devido a
grande credibilidade que Collor tinha com a população, acreditando no
fim do processo inflacionário. Porém, veio uma forte recessão econômica,
e a inflação, devido a erros da equipe econômica de Collor, acabou
voltando, principalmente devido a pouca capacidade do governo em
controlar suas despesas, como todos os outros planos econômicos, o Plano
Collor fracassou.
A invasão da Folha de São Paulo em Março de 1990
Collor
sempre considerou a Folha de São Paulo como um jornal inimigo, e agiu
nesse mesmo preceito menos de dez dias depois de tomar posse, deu sinal
verde para que a Receita e a Polícia Federal invadissem o jornal e
quatro meses mais tarde processou o seu diretor de Redação e outros três
jornalistas.
Na
tarde de sexta-feira, 23 de março de 1990, seis fiscais da Receita,
dois agentes e um delegado da PF invadiram o prédio da Folha. Zélia
Cardoso de Mello, ministra da Economia, disse a Collor que a PF faria
uma diligência no jornal. O presidente autorizou que ela fosse levada a
cabo.
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Registro Fotográfico da Invasão da Folha em Março de 1990 |
O
objetivo da invasão era conferir se o jornal estava cobrando faturas
publicitárias em cruzados novos ou na moeda recém-criada, o cruzeiro.
Conforme orientação da Associação Nacional de Jornais, a Folha fazia as
cobranças em cruzeiros. Mas foi o único deles a ter sua sede invadida e
arquivos contábeis vasculhados
Os
policiais e agentes da Receita não se encaminharam ao local onde
ficavam os arquivos contábeis da empresa. Foram direto para o andar da
diretoria e perguntaram várias vezes: "Onde está o Frias?". Não o
encontraram (ele estava noutro andar) e levaram à Polícia Federal a sua
secretária, Vera Lia Roberto, um dos diretores da empresa na época,
Pedro Pinciroli, e o diretor administrativo, Renato Castanhari. Os três
prestaram depoimento e foram liberados.

Na
edição do dia seguinte, o jornal publicou uma reportagem relatando a
invasão. Estampou também na primeira página um editorial, escrito por
Marcelo Coelho, então coordenador dos editoriais, intitulado "A escalada
fascista". O
editorial responsabilizava Collor diretamente pela invasão e o
comparava a Ceaucescu, o ditador comunista da Romênia que fora
destituído do poder e fuzilado três meses antes:
"A democracia brasileira não tolera aspirantes a Ceaucescu ou versões
juvenis de Mussolini. Aberta, como qualquer empresa, à fiscalização das
autoridades, esta Folha não aceita intimidações grosseiras nem ameaças
policiais".
Porém, essa invasão foi repudiada pela sociedade civil e dias depois a medida provisória que autorizava a invasão foi revogada.
O Impeachment de 29 de Setembro de 1992
Depois
de dois anos de mandato, explodiram na imprensa inúmeras denúncias de
corrupção envolvendo a cúpula governamental. Em entrevista publicada
pela revista Veja em 19 de maio de 1992, Pedro Collor de Mello
acusava seu irmão, o Presidente Collor, de ser testa de ferro de
negócios escusos dirigidos por Paulo Cesar Farias (PC Farias).
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Paulo César Farias |
A
gravidade das acusações levou a Câmara dos Deputados a instaurar uma
CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), destinada a apurar as
irregularidades denunciadas. No decorrer da CPI surgiram novas denúncias
e fatos incriminadores ligando a própria pessoa do presidente aos
negócios ilícitos de PC Farias. Aos poucos, foi sendo comprovada e
exposta toda uma rede de corrupção, sonegação fiscal e contas-fantasmas
do “Esquema PC”.
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A denúncia que acabaria derrubando Collor |
Enquanto
prosseguiam as investigações, o público demostrava sua indignação nas
principais ruas e praças do país, que foram tomadas por multidões e
exigindo o Impeachment (Afastamento) de Collor. Nesse movimento
popular, destacou-se a presença dos estudantes caras pintadas, clamando
por ética e dignidade na vida pública.
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Movimento dos Caras Pintadas |
Ao
final dos trabalhos, a CPI decidiu-se pela incriminação do presidente
Collor, por esmagadora maioria de votos (16 a 5). Estava aberto o
caminho legal para o processo de Impeachment. Por fim, mesmo com a
tentativa de compra de deputados por meio de liberação de verbas por
meio do Banco do Brasil, a Câmara dos Deputados aprovou a abertura do
processo de Impeachment de Collor, com 441 votos a favor. Assim,
Fernando Collor foi afastado da presidência para ser julgado pelo Senado
Federal.
No
dia 2 de outubro, o vice-presidente Itamar Franco assumiu a presidência
da república de forma interina até o dia 29 de dezembro de 1992, quando
durante a sessão de julgamento no Senado, Fernando Collor apresentou sua renuncia.
Mesmo
assim o julgamento de Collor prosseguiu e ele foi condenado e perdeu
seus diretos políticos até o Ano 2000. O Caçador de Marajás, acabou
sendo Caçado 930 dias depois de sua posse.
Refletindo sobre o período Collor vinte anos depois
Alguns
aspectos do governo Collor devem ser refletidos com um cuidado especial
20 anos depois, o primeiro é o cuidado em que devemos ter em relação
aos meios de comunicação, eles são empresas, e em sua maioria, elas
refletem as opiniões de seus donos, e grande maioria da imprensa
brasileira estava com o Collor em sua campanha e vendo que a população
tinha se voltado contra o presidente, abandonaram esse apoio na mesma
rapidez em que declaram apoio.
O
segundo ponto é relativo as políticas econômicas feitas sem um estudo
de como elas vão atingir a população, o Plano Collor foi desastroso, e
até hoje pagamos as consequências devido a reposição que o governo paga
aqueles que sofreram prejuízos e aos danos sofridos por aqueles
funcionários demitidos na onda irracional de demissões que se seguiu o
Plano Collor.
O
terceiro e o mais polêmico ponto são relativos ao Impeachment e o
movimento Caras Pintadas, eu tenho amigos, pobres coitados, que até
alegam que o Movimento Caras Pintadas foi uma farsa, negar esse
movimento de massa é tapar o sol com a peneira, mas essa não é a
polêmica maior, deve-se pensar que nem todos que foram aos protestos
tinham o objetivo de moralizar o Brasil, eu ouço de pessoas daquele
período que o Fora Collor foi uma festa, que a maioria foi só para
bagunçar, etc. Exigir que 100% das pessoas que foram aos protestos
tivessem um engajamento politico seria uma utopia, houveram pessoas que
foram para bagunças, mas eu acredito que a grande maioria queria por um
ponto final naquela corrupção que ocorria em Brasília, e o movimento
ficou marcado como um símbolo de como uma geração de jovens foi as ruas
pedindo moralidade na vida pública, sendo um exemplo para os protestos
da atualidade.
Outro
problema é que houve um aproveitamento político do Impeachment para
fazer Collor de “judas” e limpar a imagem dos políticos, ignorar que
houve uma utilização política do Impeachment pelas raposas políticas
seria ingenuidade. Porém, os grandes críticos do processo ignoram como
esse processo ajudou no fortalecimento da democracia no Brasil, o
Impeachment foi um processo inédito na América Latina, que estava
acostumada a queda dos presidentes por meio de quarteladas ou Golpes de
Estados, com o Impeachment de Collor mostrou-se que é possível retirar
um presidente corrupto por meio de instrumentos existentes dentro de um
Estado de Direito, isto é, respeitando as regras do jogo democrático.