O governo Dutra
representou um recuo aos avanços da primeira era Vargas (1930-1945), por
associar-se de forma subordinada ao capital norte-americano sem contrapartidas
reais para o desenvolvimento do capitalismo nacional e de divisas que
possibilitassem a continuidade da industrialização, eis que este governo
baseou-se políticamente em grupos vinculados aos interesses
primário-exportadores e pró-norte-americanos. Mais tarde, tanto Vargas como
seus sucessores civis iriam sofrer a oposição destes interesses, aglutinados na
União Democrática Nacional (UDN) em, em parte, a grupos vinculados à ESG
(Escola Superior de Guerra). É importante ressaltar, contudo, que os militares
não formavam um grupo coeso. É certo que a maioria era opositora de um eventual
regime populista que se transformasse em um regime socialista. Contudo, parcela
das Forças Armadas tinham um projeto de desenvolvimento nacional que não
excluía nem o capital externo, nem o nacional, e tampouco o estatal. O regime
militar irá, assim, adotar e avançar nos princípios esboçados pelos governos de
Vargas, manterá as conquistas econômicas dos anos JK, inclusive aprofundando o
desenvolvimento econômico nacional, bem como irá redimensionar a Política
Externa Independente do período Jânio e Jango, em um contexto internacional
mais favorável.
Somente durante o
governo de Juscelino Kubitschek (1956-61), que se elegeu pela coligação
PTB-PSD, é que o projeto nacional pode ser melhor estruturado em uma conjuntura
internacional e interna mais favoráveis. Internamente, a posse de JK e do vice
Jango Goulart, fora garantida por setores nacionalistas das Forças Armadas. O
crescimento econômico decorrente do Plano Qüinqüenal e da interiorização do
desenvolvimento (construção da futura capital Brasília no planalto central),
bem com a vinda das grandes indústrias automobilísticas como a WG e a opção
pelo modelo rodoviário, com a construção das modernas Brs, trouxe melhores
perspectivas para a formação de um mercado interno urbano, desenvolvimento dos
serviços, transportes, geração de emprego (e acomodação social momentânea) nos
grandes centros. Tudo isto garantiu certa coesão social que se refletiu na
estabilidade política dos anos JK. Mas seu desenvolvimento era associado aos
empréstimos obtidos em bancos privados internacionais e ao FMI. Se os empregos
e desenvolvimento trazidos pelas multinacionias foi importante para o
crescimento econômico, os empréstimos trouxeram o problema do endividamento
externo, que começaria a trazer impacto negativo para os dois governos
seguintes.
No plano externo, a
Guerra Fria conhecia novos horizontes. Por um lado, A URSS se tornava uma
potência nuclear de primeira grandeza e uma potência econômica que iria
desenvolver áreas de influência sob os recém independentes países (ex-colônias
européias) do Terceiro Mundo (Ásia e África, esta mais no começo dos anos
1960). O notável crescimento econômico japonês e alemão, aliado ao início do
processo de integração europeu, o Mercado Comum (ancestral da União Européia),
traziam para o campo capitalista desenvolvido novos competidores para a então
supremacia econômica e financeira dos EUA. O cenário mundial era, assim, mais
propício para países como o Brasil renovarem sua política de barganhas –OPA-e
algum tempo depois, já com Jânio Quadros e Jango Goulart, partir para uma
política externa mais ousada e independente em relação aos Estados Unidos e aos
centros econômicos e financeiros europeus ocidentais.
No caso da Operação
Pan-Americana (OPA), deflagrada pelo Itamaraty (chancelaria
brasileira-Ministério das Relações Exteriores), JK buscava atrair a atenção
econômica dos EUA para uma América Latina liderada pelo Brasil. A partir de
1959, com a tomada do poder em Cuba, por Fidel Castro, que iria se converter em
aliado da URSS, a argumentação brasileira de investir no país a fim de evitar a
radicalização política de uma nação estratégica para o capital norte-americano
ganha maior atenção dos EUA. No entanto, a diplomacia de JK permanecerá voltada
para o contexto latino-americano e ainda relativamente subordinada às relações
comerciais e financeiras com os EUA.
Jânio Quadros- Jango
Goulart e a Política Externa Independente. PEI
As contradições
sociais das reformas econômicas de JK iriam se fazer presente entre os anos
1961 – 1964 e, não demoraria para terem ressonância no campo político, levando
ao fatídico golpe de Estado em 1964. Em síntese, podemos dizer que a PEI,
lançada pelo chanceler Afonso Arinos, durante os sete meses do governo Jânio,
tinha os seguintes objetivos: expansão das exportações brasileiras para
qualquer país, mesmo socialistas, a defesa do direito internacional, da
autodeterminação e a não-intervenção nos assuntos internos/soberania de outras
nações, uma política de paz, desarmamento e coexistência pacífica, apoio à
descolonização completa dos territórios ainda dependentes e a formulação
autônoma de planos nacionais de desenvolvimento e de ajuda externa. Esta
política externa tinha sua lógica em razão das necessidades do desenvolvimento
brasileiro, uma vez que precisávamos de mercados consumidores, ao passo que os
EUA não contribuíam para nossa economia nos patamares desejados. Com a renúncia
de Jânio, seu vice Jango assume a Presidência e o novo chanceler, o jurista
Santiago Dantas, irá aprofundar os fundamentos da PEI a fim de utilizar os
recursos das relações internacionais para o desenvolvimento nacional. A partir
daí, a relação entre desenvolvimento interno e diplomacia ficará mais evidente,
principalmente durante o regime militar brasileiro.
A renúncia do
presidente Jânio Quadros deflagrou uma crise que só seria encerrada com o golpe
de 64. Durante os anos 1961-64, paralelo à aguda deterioração dos termos de
trocas internacionais, pelo qual os bens primários que eram ainda a base das
economias dos países subdesenvolvidos tinha cada vez menos valor em relação aos
bens de capitais (industriais e de consumo sofisticado) dos países
desenvolvidos, ocorrerá o esgotamento do modelo iniciado nos anos 1930, com a
industrialização por substituição de importações. O Brasil, que tornava-se um
país industrializado, com um parque que irá se diversificar ao longo dos anos
50, 60 e 70, já era um país em desenvolvimento, mas que ainda dependia de uma
boa colocação de produtos primários nas exportações mundiais. No começo dos
anos 60, o país se industrializava, mas as contradições sociais vinham junto,
com a pressão dos grupos urbanos (trabalhadores, etc.) e o começo do fenômeno
do êxodo rural e da necessidade da reforma agrária no meio rural. Nos anos seguintes
e durante o resto da década e da década seguinte (anos 1970), o país, já sob
governo militares, irá se tornar um grande exportador de manufaturados (bens
industrializados) e exercerá uma real autonomia diplomática em um contexto de
mundialização das Relações Internacionais. Contudo, os anos de governo Jango
ainda não estavam maduros para suportar politicamente essas mudanças, nem
tampouco o país ainda contava com recursos econômicos e coesão social
suficiente para lograr uma inserção madura no sistema internacional.
Acreditamos e podemos levantar a hipótese de que somente um rápido crescimento
econômico com redistribuição da riqueza nacional iria trazer a paz social e a
coesão interna que estava se deteriorando com o não atendimento das demandas
sociais por mais emprego e renda da maioria da população. A inflação se fazia
sentir desde os anos finais de JK, com os problemas estruturais de sempre:
custo de vida, queda na oferta de emprego, etc. aliados a cada vez maior vinda
de pessoas do meio rural em busca de oportunidades na cidade grande, o que
aumenta a possibilidade de tensões sociais. Somente um crescimento econômico
com novas políticas governamentais que superassem os limites das políticas
trabalhistas/populistas, bem como a existência de uma liderança política capaz
de mobilizar amplos (e contraditórios) setores da sociedade poderia ter evitado
o golpe militar.
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